31 de janeiro de 2010

Um ministério de reconciliação (5.11—6.10)

Um ministério de reconciliação (5.11—6.10)

A terceira característica do ministério de Paulo é a da reconciliação, à medida que ele continua a reafirmar a sinceridade dos seus atos junto aos coríntios (cf. 1.12; 2.17; 4.2). A abnegação dos seus motivos está garantida igualmente pelo temor ao Senhor e pelo amor a Cristo (5.11-15). A sua perspectiva é a da reconciliação de Deus em Cristo (5. 16-21); e o seu modo de vida como apóstolo é coerente com a sua mensagem (6.1-10). Esta é a resposta que os coríntios podem dar àqueles que procuram impugnar o caráter do ministério de Paulo.

a) O temor ao Senhor e o amor de Cristo (5.11-15). Contrariamente ao que alguns coríntios parecem afirmar, Paulo não é interesseiro nos seus atos para com eles. Ele não só é responsável perante Deus pela qualidade do seu ministério, mas também a verdadeira natureza do amor de Cristo por ele exclui tais motivos. -

Paulo tem em mente o fato e o caráter do juízo (cf. 10), e desta maneira está plenamente consciente da sua impressionante responsabilidade perante Deus.

Assim que (11) ele está persuadindo os homens, quando necessário, da integridade dos seus motivos ministeriais. A sua segurança contra qualquer falsidade de sua parte, é que somos manifestos a Deus. O seu apelo é ao que Deus conhece sobre ele; ou seja, todas as coisas (cf. Hb 4.12-13). Mas isto não é tudo: espero que, na vossa consciência, sejamos também manifestos. Será que o apóstolo não foi tão transparente com eles como tinha sido com Deus (cf. 4.2)? O seu apelo é à consciência moral (1.12; 4.2; 5.11), e não à inteligência orgulhosa deles (cf. 1 Co 1.18-3 1). Paulo acredita que no íntimo eles sabem que ele estava sendo verdadeiro.

Para que os seus adversários não interpretassem esta afirmação de sinceridade como uma manifestação de orgulho arrogante (cf. 2.17; 3.1), Paulo se apressa em esclarecer. Ele não recomeça a recomendar-se outra vez a eles.” Em lugar disso, o seu objetivo é dar a eles ocasião de vos gloriardes de nós (12). Ele deseja dotá-los de motivação e de recursos para responderem adequadamente àqueles que o atacam.

Eles estão em posição de defender o apóstolo (1.14) e deveriam fazê-lo contra os que se gloriam na aparência e não no coração. Coração, como Paulo usa, descreve “todo o homem, até as suas profundezas mais interiores”. Kuemmel escreve que aqui aparência (prosopon) “indica o homem centrado em si mesmo e hardia, o homem centrado em Deus”. O orgulho dos oponentes de Paulo é somente um pretexto, projetado para impressionar os homens e obter uma vantagem material, O fato de eles não se preocuparem com as realidades do ministério fica evidente pela sua oposição a Paulo como um apóstolo sofredor. O “orgulho deles está em uma demonstração de aparência exterior, e não no valor interior” (NEB).

Os coríntios podem perfeitamente defender a sinceridade do apóstolo (13) com base no fato de que “em Paulo o interesse próprio está integralmente derrotado, pois a sua vida é governada pela regra composta por duas partes: para Deus — para você”.’54 Bruce parafraseia a reivindicação de Paulo: “Nós estamos loucos, como podem pensar alguns? Bem, glorifiquemos a Deus. Somos calmos e sensíveis? Esta é a nossa vantagem”. Paulo foi acusado de estar enlouquecido (exestemen), assim como falaram de Jesus. “Diziam: Está fora de si” (exeste, Mc 3.21). A referência é à tensão espiritual constante em que Paulo vivia e trabalhava.

O entusiasmo do apóstolo, a sua superioridade absoluta às considerações egoístas comuns.., a sua afirmação decidida das verdades que estão além do alcance do sentido, o fogo sobrenatural que queimava incessantemente no seu peito... tudo isto constituía o estado que é descrito como estar “fora de si”, um tipo de loucura sagrada.., o discípulo e o Mestre, da mesma maneira, pareciam, àqueles que não os compreendiam, estar em uma condição de espírito demasiadamente tensa; no ardor da sua devoção, eles se permitiam ser levados além dos limites naturais.”

Considere a reação impulsiva de Festo à defesa de Paulo diante de Agripa. “Estás louco, Paulo! As muitas letras te fazem delirar” (At 26.24).” Quando o comportamento de Paulo é excepcional segundo os padrões humanos normais, como ele insiste, é para Deus; e quando o seu comportamento é normal, é para vós. Portanto, em contraste com os seus críticos, o seu comportamento, como um todo, está livre do interesse próprio.

O que constrange Paulo a agir assim é o amor de Cristo (14). O verbo constranger se refere à “pressão que aprisiona e restringe” (cf. Fp 1.23).” O apóstolo é controlado, limitado pelo amor de Cristo por ele, O genitivo de Cristo é exclusivamente subjetivo” (cf. Rm 8.35,39). Isto é indicado pela referência imediata à morte de Cristo: um morreu por todos. Para Paulo, a morte de Cristo é “a doação que Cristo faz de si mesmo sem limites”.

Ela manifesta genuinamente o amor de Deus: “Deus prova o seu amor para conosco em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm 5.8). O resultado prático é que “o amor de Deus está derramado em nosso coração pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5.5). Este é o amor que mantém Paulo cativo, um “amor que se origina e que termina com Deus em Cristo” (cf. Rm 8.28-3O).

Paulo prossegue explicando a razão pela qual o amor de Deus em Cristo tem tal poder controlador na sua motivação de vida. Ele tinha chegado a algumas conclusões vitais —julgando nós assim” — provavelmente logo depois da sua conversão. Trata-se de algo básico o fato de que Cristo morreu por todos (cf. 15). Com base nisto, duas coisas se seguem para demonstrar por que “o amor de Cristo... nos deixa sem opções” (Bruce).

A sua primeira convicção é de que, uma vez que um morreu por todos, logo, todos morreram. Este resultado implica em dois fatos em relação ao homem:

1) Quando Cristo morreu, toda a raça humana estava envolvida; pois Ele é “o Líder da raça humana... o princípio personificado da sua existência”. Assim, nele, “somos todos considerados mortos” e temos uma necessidade plena de redenção, ou Cristo não teria precisado morrer.

2) Como está indicado pela preposição por (hyper), não somente os homens estão identificados com Cristo pelo que Ele fez por eles (isto é, morreu), mas também, naquele evento, Ele mesmo se identificou com o pecado dos homens (versículo 21; cf. 1 Pe 2.24). A idéia de substituição está envolvida. Como escreve Tasker, “a morte de Cristo foi a morte de todos, no sentido de que Ele morreu a morte que todos deveriam ter morrido”)”

Em vista da morte de Cristo, todos os homens estão mortos, com respeito a qualquer auto-suficiência espiritual. A interpretação mais simples é a de que o fato de que Cristo morreu por todos prova que todos estavam mortos. Isto nos leva à segunda convicção de Paulo, que exclui o interesse próprio da vida daquele que é “controlado pelo amor de Cristo” (Moffatt). Ele morreu por todos, para que os que vivem no mundo não vivam mais para si, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou (15; cf. Rm 14.7-9; 1 Co 3.21-23; Gl 2.20).

A Ressurreição e a Crucificação estão inseparavelmente unidas pela obra expiatória de Cristo (Rm 4.25; 1 Co 15.17). A identificação, pela fé, com Cristo na sua morte, envolve a união com Ele na sua vida ressurrecta (Rm 5.10). A antiga vida pecaminosa que tinha o “eu” como o foco do interesse dá lugar a uma nova vida centrada naquele que por eles morreu e ressuscitou. Isto “quer dizer que a raiz do pecado é removida da sua vida”. Assim, a justificação se alarga para envolver a santificação. Segundo as próprias palavras de Paulo: “o nosso velho homem foi com ele crucificado... a fim de que não sirvamos mais ao pecado... Ora, sejá morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos.., quanto a ter morrido, de uma vez morreu para o pecado; mas, quanto a viver, vive para Deus.

Assim também vós considerai-vos como mortos para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 6.6-11). Para Paulo, “o viver é Cristo” (Fp 1,21). Numa vida assim, não há lugar para uma vida centrada em si mesmo (cf. Fp 2.5-18). Paulo nunca procura meramente exaltar e favorecer a si mesmo, 1) porque ele é completamente transparente diante do Deus a quem ele deve responder pela integrida- de do seu ministério, O seu verdadeiro ser

a) é sincero para com os seus convertidos, 11,

b) está em contraste com a falsidade dos seus críticos, 12. Paulo não se recomenda (2) porque ele é sustentado pelo surpreendente alcance do amor de Cristo por ele.

Esse amor, realizado na morte de Cristo no seu nome, pode controlar radicalmente os seus motivos porque

a) ele está ciente do desamparo desesperador da morte da qual ele foi libertado, 14, e porque,

b) ele é conquistado pela qualidade transcendente da vida que ele está livre para viver, 15. Paulo é contido pela sua esmagadora responsabilidade para com Deus e pela sua vida gratificante em Cristo.

b) A perspectiva da reconciliação (5.16-21). A sinceridade de Paulo é fundamentada no próprio caráter da sua mensagem. Ele proclama o ato reconciliador de Deus em Cristo, um evento que forneceu o critério final para a sua visão de si mesmo e de outros. Em uma afirmação explicativa (16), que está relacionada com o pensamento de que “todos morreram” (14), Paulo afirma a sua maneira diferente de considerar os homens. Mesmo depois da sua descoberta do significado da morte de Cristo (“daqui por diante”), ele não “conhece ninguém em termos de um relacionamento que seja puramente deste mundo” (Bruce).

Segundo a carne (cf. 1.17; 10.2; 11,18) faz referência às distinções tipicamente mundanas raça, posição social, riqueza e títulos segundo as quais os homens se consideram uns aos outros. Os valores dos críticos de Paulo eram desse tipo (12). Mas a morte de Cristo removeu a importância desses parâmetros (14), pois eles são contrários à realidade resultante do Espírito (Rm 8.5; cf. 1 Co 3.1-4).

Mesmo que Paulo tenha anteriormente visto a Cristo pelo critério carnal da sua cultura (Fp 3.4-6; cf. 01. 1.13-14), ele já não mais o faz,16’ pois isto o levou a julgar a reivindicação de Jesus da filiação messiânica como sendo uma blasfêmia, e a perseguir os seus seguidores (1 Tm 1.13). Agora, ele conhece a Cristo como Ele realmente é o Senhor ressuscitado e exaltado (Fp 2.5-11). Paulo pode ter tido contato com Jesus durante o seu ministério terreno, mas isto não é o que ele está dizendo aqui.

Como uma conseqüência direta dos versículos 14-15, vem um dos versículos mais fascinantes na epístola, com a sua “antecipação grandiosa”. Da morte veio a nova vida que alguém vive no Senhor, “uma nova vida, num novo contexto” que Paulo descreve com a sua expressão mais característica: em Cristo (17). Estar em Cristo é ser uma nova criatura (cf. 016.15; Ef 2.10; 4.24). Por meio de Cristo, uma situação completamente nova foi criada (cf. Is 43.19; Ap 21.15). Uma nova ordem das coisas nasceu, trazendo consigo um novo homem. O homem é uma nova criatura “em virtude do novo relacionamento com Deus”. Todos os relacionamentos anteriores, embora honrados pela idade, já passaram, porque “eis que tudo se fez novo”.

O apóstolo está jubiloso com a idéia. O seu ministério está baseado no fato de que “tudo está obsoleto... e perde qualquer valor diante daquela perspectiva exclusiva à qual, de agora em diante, tudo converge”.” Denney sugere que “ser guiado por distinções mundanas é conhecer somente algumas poucas pessoas, conhecê-las pelo que é superficial na sua natureza; mas ver que tais distinções morreram com a morte de Cristo, e olhar os homens em relação a Ele, que é Redentor e Senhor de tudo, é conhecer todos os nossos irmãos, e conhecê-los não superficialmente, mas profundamente”.

Significativa para o pensamento de Paulo aqui, como também para toda a sua perspectiva, é a expressão em (en) Cristo.

Com ela, ele retrata vividamente a sua convicção de que é no seu relacionamento íntimo pessoal com o Cristo ressuscitado que a salvação de Deus é continuamente percebida; em Cristo está em contraste direto com “debaixo da lei” (cf. Rm 6.14; 8.2).” Estar em Cristo significa ser levado até a esfera da completa atividade redentora de Deus (5.21; 1 Co 1.30). Isto resulta de uma identificação realista com a pessoa de Cristo, crucificado e ressuscitado, uma morte e uma ressurreição com Cristo (Rm 6.1-12; Gl 2.20).

O conceito é social,como também individual (1 Co 1.2); estar em Cristo é um compartilhar (koinonia) em Cristo (1 Co 1.9). Paulo imagina Cristo — em virtude da ressurreição como o Segundo Adão (Rm 5.12-21; 1 Co 15.45) e o Líder de uma nova humanidade da qual Ele é “as primícias” (1 Co 15.20,23), o “primogênito” (Rm 8.29; Cl 1.18) e o “espírito vivificante” (veja 1 Co 15.45).

Cristo está realística e intimamente conectado com a nova humanidade como o seu Líder representativo. Nesta expressão-chave, em Cristo, Paulo parece ter feito uso da idéia hebraica de personalidade corporativa, pela qual pode-se pensar em uma comunidade em termos do seu líder representativo.”

Esta nova situação, na qual os homens são novas criaturas em Cristo, se deve ao ato criativo de Deus (cf. 4.6; Rm 3.25; 11.36). Tudo isso provém de Deus, testemunha o após- tolo, porque Ele nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo (18-19).

A reconciliação envolve a superação da alienação pessoal (Ef 4.18) ou da hostilidade (Cl 1.21), causadas pela rebelião do homem contra o seu legítimo Soberano. O resultado é uma nova condição de paz (Rm 5.1; GI 5.22; Ef 2.12-17; Fp 4.7) e a restauração da comunhão.

E o homem que deve ser reconciliado, e não Deus, como no judaísmo, pois é Deus quem realiza a reconciliação. Certamente está envolvida a ira de Deus contra o pecado dos homens (Rm 1.18; 2.5), caso contrário os pecados que praticaram não seriam computados contra eles. Mas Deus, no seu amor sagrado, tomou a iniciativa. Na cruz de Cristo, Ele se tornou o Agressor e invadiu a vida humana extraviada com um amor cheio de perdão. “Se nós, sendo inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho... o amor de Deus está derramado em nosso coração” (Rm 5.10, 5).

A “maior mudança possível ocorreu no homem... na sua natureza completa e na sua vida”,que estão alteradas por causa da mudança do relacionamento entre Deus e o homem. O pecado é tratado adequadamente com (21) respeito ao que ele causou ao homem (Rm 7.5-25; 8.2) e também com respeito ao que ele significa diante da santidade de Deus (Rm 3.21-26). Para Paulo e para os coríntios a reconciliação foi realizada. O caminho agora está aberto para todos, e ao apóstolo foi confiado o ministério da reconciliação. Este é o clímax da passagem e a razão final pela qual ele não pode viver para si mesmo (13-15).

A sua tarefa é anunciar a novidade aos homens, isto é (“neste sentido”), Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo. Nenhuma vírgula deve ser colocada de- pois de Cristo (cf. AS RSV), pois o que Paulo quer destacar é o que Deus fez em Cristo. O elo (Rm 5.9-10) entre a reconciliação e a justificação (12) é mostrado na palavra imputando (“levando em conta”, ASV; cf, Rm 4.3-8).

A obra da reconciliação, no entanto, não está completa no que diz respeito ao mundo, pois Deus pôs (“depositou”, Weymouth) em Paulo a palavra187 da reconciliação (cf. 1 Co 1.18). A palavra (logos), segundo Cullmann, “é a revelação final e definitiva como tal”. A palavra da reconciliação é a essência do ministério da reconciliação. A palavra qualifica plenamente todas as fases do ministério. Este ministério não trata basicamente de dar bons conselhos, mas sim de comunicar aos homens as boas-novas do que Deus fez em Cristo pelo mundo. Assim, Paulo é servo da sua mensagem.

Como embaixadores da parte de Cris- to (cf. Is 52.7; Ef 6.20), Paulo e seus colaboradores servem como representantes de (hyper) Cristo (20). O seu trabalho apostólico é semelhante ao de um poderoso representante de um imperador antigo. A sua dignidade e autoridade são as do seu Soberano. Não é como se, mas “vendo que” Deus por nós rogasse (Weymouth), a base do seu apelo urgente e piedoso. Ele insiste, da parte de Cristo, que o mundo se reconcilie com Deus. Aqui estão o valor e a dinâmica do seu ministério. Deus, pelo Espírito de Cristo, está por trás da pregação de Paulo e na verdade fala através dele. A sua palavra é a palavra de Deus (cf. 1 Ts 2.13).

Uma teologia do ministério cristão pode ser encontrada nestes versículos. A reconciliação dos homens tem duas causas eficazes: 1)o que Deus fez em Cristo o fez pecado por nós; e 2) como resultado disso, o que Cristo significou para nós nele, fôssemos feitos justiça de Deus (21). Bengel sugere que “Ele foi feito pecado da mesma maneira como nós somos feitos justiça”. Nele (en auto) corresponde a por nós (hyper hernon). Os dois lados adotaram o que não era merecidamente deles. Cristo, que “era inocente do pecado” (NEB), entrou numa esfera completamente estranha à si mesmo, para que nós pudéssemos entrar numa esfera da qual nos alienamos.

Cristo, um estranho absoluto a qualquer rebelião contra o Pai (Jo 8.46; Hb 4.15; 1 Pe 2.22), foi tratado como se fosse completamente responsável pela rebelião do homem contra Deus (Is 53.6; 1 Pe 2.24). Ele sofreu “o que Deus faz ao pecado, e tornou visível o que acontece quando o homem tem Deus contra si”. Cristo tornou-se “uma maldição por nós” (GI 3.13; cE Dt 21.23; Is 53.12; Lc 22.37; Rm 8.2).

A expressão Deus... o fez indica a unidade entre Pai e Filho na identificação com o pecado (Jo 10.30; Fp 2.8; Hb 9.1-14). No sentido definitivo, é Deus quem sofre em si mesmo as conseqüências do pecado do homem, pelo seu amor perdoador (Rm 13.8).

O resultado é “o perdão no seu sentido mais amplo”, a restauração de uma relação correta com Deus com a libertação e a novidade de vida exigidas por essa relação. A justiça de Deus é uma atividade de Deus (Rm 1.17) pela qual Ele defende a sua causa ou realiza os seus objetivos entre os homens. Ser considerado por Deus como justo é um ato régio, não de absolvição, mas de anistia ou de perdão (Rm 3.24-26).

A justificação é uma ação forense, mas a imagem de meras palavras está fragmentada, pois não é “uma mera palavra, mas é a palavra de Deus que trabalha e cria a vida”. Assim o homem é levado à justiça de Deus, numa nova condição de vida (15, 17), cujo mérito é a cruz de Cristo e cuja substância é o Espírito de Cristo. O caráter justo resultante do homem é o da justiça da sua nova relação com Deus (Fp 3.9), e a sua posse daquele Espírito correto, o Espírito Santo transformador (3.18), que lhe foi dado (Rm 5.5).

Novamente, a justificação se estende para envolver a santificação, pois é uma justiça nele (17) que se tornou, para nós, “justiça, santificação e redenção” (1 Co 1.30).’ A abordagem de Paulo do seu ministério é supremamente “em Cristo”.

1) Como uma nova criatura “em Cristo’, ele está alerta para o mundo dos homens (16-17). Como tal,

2) a ele foi confiada a mensagem do ato reconciliador de Deus “em Cristo” (18-19), para que

3) ele possa oferecer aos homens a oportunidade gratuita, “em Cristo”, de se tornarem a justiça de Deus (20-21)

c)A vida de um apóstolo (6.1-10). A divisão dos capítulos aqui é bastante arbitrária.

Paulo ainda está defendendo o caráter do seu ministério do ponto de vista da sua conduta e das suas experiências como um embaixador de Cristo.

O pensamento de 5.20 se conclui quando Paulo, com base na sua mensagem (5.21), exorta urgentemente os fracos crentes coríntios a não receberem’9’ a graça de Deus em vão (6.1). O seu medo é que eles não permitam que a salvação de Deus em Cristo realmente produza o fruto desejado de um caminhar santo — uma vida que responda adequadamente à morte de Cristo (5.14-15), e que possa enfrentar o juízo sem ter do que se envergonhar (5.10; cf. 1 Co 3.10-15).

O novo relacionamento com Deus, que nasceu através de Cristo, não se mantém automaticamente. Assim, eles são instigados a não “abrir mão dele por nada” (NEB). Paulo faz o seu apelo aos que estão cooperando com Deus

(5.18, 20; 1 Co 3.9). Beardslee conclui que o apóstolo é muito cauteloso ao falar de Deus e do homem como trabalhando juntos. Ele sugere que “seria mais verdadeiro para o pensamento de Paulo dizer que todo trabalho humano real é um trabalho de Deus, do que dizer que Deus e o homem trabalham juntos”.

Isto está de acordo com a declaração de lsaías 26.12 — “Senhor... tu és o que fizeste em nós todas as nossas obras”.

O versículo 2 é um parênteses que revela uma das suposições fundamentais do evangelho de Paulo; a urgência do seu apelo é reforçada pela interjeição de Isaías 49.8. Ali, o Servo do Senhor tem a promessa de ajuda no dia em que a salvação for oferecida aos gentios (Is 49.1-12). Aos seus leitores, portanto, Paulo anuncia: eis aqui agora o tempo aceitável, eis aqui agora o dia da salvação (2). O que os coríntios sentiram por meio da proclamação do apóstolo foi o verdadeiro cumprimento dessa profecia. A ação salvífica final de Deus está tendo lugar no presente; as últimas coisas não são mais um evento distante. Hoje é o tempo aceitável por Deus para que os homens participem livremente da sua reconciliação em Cristo: “O tempo do diabo é sempre o amanhã; o tempo de Deus é sempre o hoje”

A exortação de Paulo e dos seus colaboradores não é incoerente com a qualidade das suas vidas. Dando (3) e tornando-nos (4) são particípios coordenados com “cooperando” (1). A consciência do apóstolo está limpa, pois ele sempre procura “não dar escândalo em coisa alguma” (NASB), para que o seu ministério não seja censurado. Nenhuma causa real para a rejeição da sua mensagem pode ser encontrada na sua conduta. Este é o caráter do ministério cristão.

Mas como os seus caluniadores coríntios aparentemente sentiram que a honra da indicação feita por Deus significava sucesso e proeminência, Paulo teve que ressaltar que até mesmo os seus sofrimentos eram demonstrações da autenticidade do seu apostolado (45) 201 Em tudo possivelmente em todas as ocasiões — Paulo e seus companheiros de trabalho se tornavam recomendáveis (dignos de elogio, cf. 3.1; 4.2; 5.12) como ministros (servos; cf. 6.4; Mt 20.26; Mc 10.43) de Deus. Redpath sugere que todas as condições mencionadas em 4-10 “fornecem uma plataforma para a exibição da graça de Deus” na vida dos seus servos.

Paulo recomenda o seu ministério, primeiramente, na muita paciência (“grande persistência”, RSV). Esta qualidade, muita ressaltada por Jesus (Mt 10.22; 14.13; Lc 8.15; 21.19) e certamente significativa para Paulo (1.6; 11.23-30; Rm 5.3; 1 Ts 1.3), coloca-se no topo de três grupos de provações. O primeiro grupo, no versículo 4, apresenta os sofrimentos de Paulo em termos gerais. Eles podem se referir àquelas dificuldades que são independentes do agente humano, e incluem aflições (cf, 1.3-10; 2.4; 4.8, 17;At 14.22; 20.23), todas as experiências de pressão física, mental ou espiritual que talvez possam ser evitadas; necessidades (“privações”, NEB), que não possam ser evitadas; e angústias (“dilemas”, NEB, 4.8), das quais não é possível escapar.

O segundo trio (5) especifica os sofrimentos em particular que são infligidos pelos homens.

Paulo se esforça para recomendar a si mesmo como um servo fiel de Deus, “mostrando a suprema paciência entre” (Bruce) açoites (11.23; At 16.23), prisões (11.23; At 16.23-24) e tumultos (At 13.50; 14.19; 16.19; 19.29; 21.30). O terceiro trio consiste daquelas disciplinas que ele impôs a si mesmo para a proteção da sua missão: nos trabalhos, nas vigílias, nos jejuns.

O grande apóstolo, para o bem do evangelho, freqüentemente:

1) se cansava até o ponto da exaustão,

2) diminuía as suas horas de descanso para dedicar mais tempo ao ministério da Palavra e à oração, e

3) negligenciava as suas refeições quando o trabalho era urgente.

Tendo concluído com as nove condições que indicam a esfera da persistência, Paulo agora toma um novo fôlego. Ele enumera nove características espirituais, coordenadas com a virtude da pureza, que Deus o capacitou a demonstrar como um ministro de Cristo (6-7). O apóstolo manteve pura a sua vida e os seus motivos verdadeiros. Ele possuía a ciência do que Deus tinha feito em Jesus Cristo (cf. 8.7; 11.6; 1 Co 2.6-16) tanto na sua própria vida quanto nas suas implicações para todos os homens. Ele tinha a longanimidade, em que poderia suportar os ferimentos, os insultos, a teimosia e a estupidez das pessoas sem ira nem vingança (cf. Cl 3.12).

Mas além da persistência, ele era complacentemente bondoso e tolerante nas suas relações com tais pessoas (cf. Lc 6.35; 1 Co 13.4; 01 5.22). O Espírito Santo, que é a própria dinâmica de todas as virtudes de Paulo, estava sendo demonstrado no seu ministério (1 Co 2.4; 1 Ts 1.5). O fruto básico do Espírito, que é o amor genuíno (cf. Rm 12.9; 1 Tm 1.5; 1 Pe 1.22), reflete a própria atitude de Cristo (cf. 5.14; 1 Co 13.1-13) na vida do apóstolo.

A palavra da verdade (genitivo objetivo) se refere à proclamação que Paulo faz da verdade do evangelho (cf. 5.19; Ef 1.13; Cl 1.5). Tudo isto ele fez no (en) poder de Deus (cf. 4.7-11; 12.9-11; 1 Co 2.3-7). O seu ministério é a própria atividade de Deus (5.20). Com uma mudança nas preposições (dia substituindo a en de 4-7a) Paulo afirma que as suas armas (cf. 10.4) fazem parte da armadura (cf. Is 59.17; Rm 13.12; Ef 6.13-17; 1 Ts 5.8) “que a divina justiça provê” (5.21; cf. Rm 6.13). Dos recursos do seu relacionamento com Deus e está plenamente equipado tanto com armas ofensivas quanto defensivas. Pois à sua direita ele tem a “espada do Espírito” (Ef 6.17), e à sua esquerda, “o escudo da fé” (Ef 6.16).

A seguir vem uma lista de nove condições contrastantes que Paulo sofre com alegria pelo bem do seu chamado (8-10). Este é o terceiro intercâmbio de experiências opostas em Cristo que ele relaciona na carta (1.3-7; 4.7-12). O mesmo paradoxo de humilhação e glória que caracterizou a carreira de Jesus é parte integrante do ministério de Paulo.

Isto já está evidente no contraste entre os versículos 4-5 e 6-7. Os primeiros quatro pares (8-9a) apresentam as maneiras como Paulo é considerado por diversas pessoas:

Por honra e desonra
por infâmia e por boa fama
como enganadores e sendo verdadeiros,

como desconhecidos, mas sendo bem conhecidos

Os últimos cinco pares (9b-10) apresentam os fatos reais da existência ministerial do apóstolo em relação a Jesus Cristo. Esta relação era um estado de coisas “determinadas pela crucificação e ressurreição, e pela posição subordinada deliberadamente assumida pelo Cristo exaltado”. Na verdade, Paulo vive:

como morrendo e eis que vivem os

como castigados e não mortos

como contristados, mas sempre alegres

como pobres, mas enriquecendo a muitos

como nada tendo e possuindo tudo

Assim, como um ministro da reconciliação de Deus em Cristo, Paulo pode exortar os coríntios por duas razões, a fim de não frustrar a graça de Deus nas suas vidas. Em primeiro lugar, está o fato de que o seu ministério é Deus verdadeiramente trabalhando na ação redentora do último dia (1-2).

Em segundo lugar, a qualidade da sua vida de serviço não impede a aceitação da graça de Deus (3).

Antes, a vida de Paulo exibe aquela graça

a) ao suportar diversas provações, 4-5;

b) manifestando as verdadeiras características do novo homem em Cristo, 6-7; e c) através de um ministério que compartilha o paradoxo da própria vida de Jesus, 8-10.

A essência da tarefa de Paulo como apóstolo é o ministério da reconciliação (5.11-6.10). E uma missão

1) cujos motivos são encontrados no ato de Deus em Cristo, 5.11-15;

2) cuja perspectiva é o ato de Deus em Cristo, 5.16-21; e

3) cuja conduta participa da natureza do ato de Deus em Cristo, 6.1-10.

Examinando rapidamente a caracterização que Paulo faz do seu ministério (3.1— 6.10), é evidente que ele defende o seu trabalho pela natureza da mensagem que lhe foi confiada, e experimentada pelos cormntios:

1) O seu ministério é primordialmente do Espírito, devido à obra do Espírito Santo, 3.1—4.6;

2) isto é possível porque tudo o que Paulo suporta por amor a Jesus é a morte de Jesus, que libera o Espírito Santo aos seus ouvintes — a vida ressurrecta de Jesus, da qual Paulo irá compartilhar plenamente no futuro, 4.7—5.10;

3) mas as duas condições só são verdadeiras pelo fato de o ministério de Paulo consistir do ato de reconciliação de Deus, em Cristo, para o mundo, 5.11—6.10.;

Elaboração pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus (auxiliar)

Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS

Comentário Bíblico Beacon

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